sexta-feira, junho 23, 2006

Love letters

Em tempos de internet a troca de cartas entre particulares vai se tornando algo cada vez mais excepcional. Os meios eletrônicos, não apenas email, mas também orkut, MSN e Skype, substituem na maioria das vezes o que antes seria comunicado por uma carta. Mas, toda mudança de mídia acarreta em alteração no conteúdo, ainda mais se tratando de mídias tão dinâmicas. Percebe-se um cuidado cada vez menor com a escrita das mensagens, especialmente das instantâneas. Até mesmo a possibilidade de pular, editando de forma não linear pedaços da correspondência, interfere no estilo.

Entretanto, aonde tudo isso se torna mais claro é nas cartas de amor. Jamais uma mensagem de amor enviada por email, com o mesmo conteúdo, terá o mesmo efeito de uma carta tradicional. A correspondência escrita em papel tem algo que a diferencia das formas eletrônicas, a começar pela sua durabilidade. Uma carta de amor em papel pode ser guardada, relida, e encontrada pelos tataranetos na caixinha de música empoeirada, ao passo que o email só vai durar até o próximo computador ou vírus. Aos que acreditam em impressora, esqueçam. Um email apaixonado, uma vez impresso, é tão atraente quanto à conta do banco e vai acabar na lata de lixo.

Mas não é só. Uma carta, logicamente manuscrita, leva ao final a assinatura do remetente, mostrando o seu comprometimento com as palavras acima. Assim como uma correspondência eletrônica tem menos valor num Tribunal, também pesa menos no nosso imaginário. E aquele que for se dedicar a escrever uma carta de amor vai, certamente, utilizar-se do melhor papel e envelope, ainda que sem maiores e desnecessárias frescuras, demonstrando sua atenção e consideração para com a destinatária.

Além disso uma correspondência é uma comunicação privada que se dá dentro de um espaço aberto, ao contrário do email. A carta será manuseada por empregados e chegará ao conhecimento do restante da família da moça. Por isso implica mais formalidade que o email e, com isso, maior importância. É um detalhe que poucos percebem, mas Mr. Darcy em Orgulho e Preconceito aguarda o passeio de Elizabeth para entregar pessoalmente a carta com suas explicações. Isso ocorre porque, sendo os dois solteiros e em idade núbil, seria inadequada a correspondência. Por sua vez, Elizabeth não pode o defender com o conteúdo da correspondência sem trair sua confiança. Os tempos mudaram, os costumes também, mas as razões para a importância da carta permanecem.

Por fim, assim como os livros ainda não foram superados por suas versões eletrônicas (é só ver quantos preferiram imprimir O Stalker), também a carta de amor manuscrita tem as suas vantagens. A jovem que recebe uma carta de amor pode ler e reler na cama, ao sol, no jardim, além de a abraçar, coisas que jamais poderá com o email. Porque beijar a letra manuscrita do amado é uma coisa, agora, arial 12, sem condição...
Mas o desuso das cartas funciona a favor delas. A surpresa de receber uma carta quebra o infeliz ritual de verificar contas e malas-diretas. Assim, continuo com o meu arsenal antiquado, escolhendo até mesmo a caneta (jamais uma esferográfica comum), ainda que o email seja admissível como uma forma complementar.